terça-feira, 31 de julho de 2007

Cansei, CRIA e outros ecos de 64

Parte da mídia acordou para estes movimentos golpistas que estão sendo preparados com aquela sutileza característica de nossa elite. Aqui e ali surgem vozes criticando e alertando contra estas mobilizações suspeitas conforme estamos antecipando há tempos aqui no blog. Hoje a Folha publica artigo do jornalista Janio de Fretas que desnuda esta armação. Eu ate ia mas longe e acrescentaria um tal movimento denominado CRIA, formado por jovens riquinhos totalmente tucanos que com seus carros importados fizeram uma manifestação no domingo de manhã aqui em SP. Mas sobre eles falarei mais tarde. Agora apreciem o texto do Janio de Freitas:


Cansei de "basta!"

O que mais deseja a riqueza do país, além das condições inigualáveis que o governo Lula lhe proporcionou?

O ODOR EXALADO pelo movimento "Cansei", ainda que nem todos os seus fundadores tenham propósitos precisamente iguais, é típico do golpismo que sempre foi a vocação política mais à vista na riqueza, não importa se cansada ou não. A fonte de onde surge não lhe nega a natureza pressentida: um escritório de negócios em São Paulo, tal como se identificaria nos primórdios de todos os golpes e tentativas de golpe desde 1944/1945, pelo menos.
Também denominada "Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros" -batismo que os padrinhos relegaram, por considerarem o apelido "Cansei" mais representativo dos seus propósitos- o que a iniciativa sugere, de fato, é uma interrogação.
O que mais deseja a riqueza brasileira, além das condições inigualáveis que o governo Lula lhe proporcionou? O fim da inflação, o emudecimento do sindicalismo e das reivindicações sociais; concessões transgênicas para todos os tipos de grandes empresas e negócios, Bolsa farta e imposto baixinho ou a zero; e, sobretudo, a transferência gratuita de um oceano de dinheiro dos cofres públicos para os da riqueza privada, por intermédio dos juros recordistas concedidos pelo próprio governo aos títulos de sua emissão. Ainda não basta?
O que deseja a riqueza não pode ser a correção das deformidades socioeconômicas, institucionais e políticas que refreiam o Brasil, enquanto países do seu aparente status desenvolvem-se a níveis exuberantes. É da não-correção que vem grande parte das facilidades pelas quais a riqueza se multiplica sem cessar: a fraqueza ética do Congresso, a corrupção administrativa que só tem o corrupto e não o corruptor, as eleições movidas a marketing endinheirado, e por aí.
Além disso, nunca se viu a riqueza movendo-se, de fato, por correções e reformas a serviço do interesse do país. Os seus lobbies e outros meios só se movem, historicamente, por alterações que privilegiem os interesses da própria riqueza privada. Assim é a história parlamentar e administrativa do Brasil, para dizer o mínimo, do último meio século.
O governo Lula deu e dá à riqueza privada a situação que a ela deu o "milagre econômico" da ditadura, porém, agora sem os inconvenientes produzidos pela força. A quem vive no Brasil em nível de primeiríssimo mundo, conviria, portanto, demonstrar um pouco mais de compostura. Se não para aparentar recato que lhe falte, por um grão a mais de esperteza.
"Cansei" -e daí? Vai fazer ou, pelo menos, propõe o quê, de objetivo, prático e necessário? Disse um dos "cansados": "Queremos despertar em cada indivíduo o que ele pode fazer para mudar o país". Pois façam isso no seu próprio movimento. Sem que, para tanto, o seu alegado cansaço exale sentidos que, intencionais ou não, negados ou não, vão até onde não devem.

domingo, 29 de julho de 2007

O piloto errou - estrondoso silêncio na mídia

A revista Veja desta semana divulgou as primeiras informações da caixa preta do avião da TAM . A conclusão dos peritos é que o piloto errou ao acionar os manetes (controles da turbina). Três outros acidentes idênticos com Airbus já aconteceram no mundo nos últimos 10 anos. A matéria vai além e diz que o avião não aquaplanou na pista! Pois bem, esperei manchetes no Jornal Nacional de sábado, destaques nas primeiras páginas nos jornais e não encontrei uma escassa linha. Só agora há pouco (domingo, 8 da noite) a TV Record mencionou a revista e fez ampla reportagem. Por que o silêncio? Não é por causa do furo ter sido dado por outro órgão de imprensa. Outras reportagens da revista já foram mencionadas no passado. Por que não agora? Por que não interessa divulgar? E por que não interessa divulgar? Bom, talvez porque a mídia conservadora e a elite predadora deste país perdem o principal mote de agitação contra o governo, que pode ser acusado de tudo, menos de responsabilidade neste trágico acidente. Enquanto isso, voltamos a 64 com a nova marcha da família com Deus pela tradição que ocorreu hoje de manhã. O pretexto oficial era protestar contra o Governo por causa do acidente da TAM, mas assim como no passado o interesse oculto era (e é) outro.

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Ainda a deformação da opinião pública

Leio na coluna do jornalista Nélson de Sá que a manchete do Jornal Nacional de quarta-feira foi a seguinte:

"A crise aérea derruba o ministro Waldir Pires e o presidente Lula empossa Nelson Jobim, ex-ministro do governo Fernando Henrique."
De WILLIAM BONNER, na manchete do "Jornal Nacional".

Repararam que na manchete, texto curto em que só devem ser colocadas as informações principais e relevantes, o editor da Globo colocou que Nélson Jobim foi ministro de FHC? Não deixa de ser verdade, mas por que o destaque? Qual sua relevância? Seguindo a lógica, toda vez que o jornal falasse de Renan Calheiros tinha que informar que ele foi ministro de FHC. E da Justiça!

Depois tem gente que diz que faz jornalismo isento...Claro, claro..

Os agitadores saem da toca

Parece 64. Não, não sou tão velho assim, mas já li muito e adoro História. Naquela época organizações como IPES/IBAD criadas pela elite tupiniquim, entenda-se empresários, mídia conservadora e políticos à direita e os oportunistas de sempre, tinham como objetivo desestabilizar o regime democrático no país e criar as condições para o golpe militar, o que acabou acontecendo e lançou o Brasil nas trevas. Mais tarde, parte da mesma elite criou a até hoje ainda mal-esclarecida Operação Bandeirante, praticamente um grupo paramilitar de combate aos esquerdistas e oposição.

Pois bem. Pouco mais de 40 anos depois e lá vem a mesma tática. Leio na coluna da Monica Bergamo na Folha que empresários, banqueiros, mídia etc estão se reunindo para iniciar um suposto movimento cívico...Mesma conversa fiada da época do IPES/IBAD e quem sabe com os mesmos propósitos obscuros. Vale uma leitura de artigo publicado na revista História Viva e que conta como a elite brasileira articulou o golpe de 64. Vejam as semelhanças...

O pior de tudo é ver associações assistenciais ou ONGs envolvidas nisso. Talvez o pragmatismo de se juntar aos poderosos para conseguir ajuda financeira explique esta posição, mas para mim isso é como vender a alma ao demo. O mais inacreditável é que muitos que hoje tocam estes projetos sociais viveram 64 e estavam do outro lado das barricadas.

Enfim, vamos ver até onde vai este circo. Se a história se repete, como já disse alguém, é bem provável que vejamos este triste filme mais uma vez. Abaixo as notas publicadas na coluna da Monica Bergamo e que tratam do tal movimento cívico da elite deste país. Não, não tinha nenhum torneiro mecânico entre os presentes...

Moral e cívica
Representantes da Fiesp, de bancos, de publicitários e de alguns meios de comunicação fizeram reunião anteontem no escritório do empresário João Doria, em SP, para finalizar o lançamento de um "Movimento Cívico" no Brasil. Preocupados com a possibilidade de se colocar frontalmente contra o governo Lula - ou, como diz o informe produzido por um dos presentes ao encontro, "para evitar conotações políticas"-, ficou decidido que a única entidade que assinará a campanha será a OAB.
As propostas do já batizado "Movimento Cívico" são: marcar um minuto de silêncio para o dia 17 de agosto, um mês depois da tragédia de Congonhas; elaborar peças publicitárias para TV e rádio, convocando as pessoas para o ato com frases como "cansei de corrupção", "cansei de apagão aéreo", "cansei de bala perdida"; criar blog de protesto na internet.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

A politização das mortes

Este é o título de artigo do jornalista Fernando Rorigues na Folha desta quarta-feira. Ele faz uma análise isenta de toda esta briga política que virou a tragédia do acidente com o avião da TAM. O único reparo que faço é que, apesar de que ambos os lados (oposição e governo) estarem em guerra, as armas da oposição, com o barulho incansável de boa parte da mídia e forte apoio em setores da elite, desequilibram muito o jogo e, como já disse em posts anteriores, há um evidente flerte com o golpismo. Temos que ficar atentos. De qualquer modo, coloco abaixo a íntegra do texto. Leiam e reflitam:

"A politização da tragédia do acidente do Airbus da TAM está no ar. Contaminou governo e oposição. Desde o "top, top, top" de Marco Aurélio Garcia até o desastrado deputado federal Efraim Filho (DEM-PB). O governo torce freneticamente para que as investigações concluam pela irrelevância da pista de Congonhas no acidente. Daí Marco Aurélio ter comemorado de maneira efusiva ao saber do defeito num equipamento do avião (o sistema de reversão da turbina direita).

Da mesma forma, o político paraibano Efraim Filho foi comissionado pelo Democratas para faturar em Washington. Advogado de 28 anos, acompanhou a abertura da caixa-preta -mesmo sendo neófito em assuntos aeronáuticos. Sem cerimônia, apresentou uma conclusão peremptória sem base científica: o piloto da TAM não tentou arremeter. Quis frear e a pista escorregadia não teria permitido. Efraim Filho acabou recuando. Mas ficou o estigma. Ao escalar o rapaz para função tão relevante, o Democratas, nesse episódio, parece ter dado o pior de si. Em público, lulistas e oposicionistas fingem consternação. Nos bastidores, há uma torcida gigante sobre o resultado das apurações.

Repórteres recebem telefonemas irados dos dois lados. Lulistas e oposicionistas cobram "imparcialidade", sobretudo quando se trata de noticiar algo que possa vir a favorecer o lado de quem reclama. Existem, é claro, aqui e ali, algumas cabeças ancoradas no bom senso. São a minoria. A regra mais geral tem sido politizar as notícias ao osso. Patético. O efeito eleitoral final será pequeno ou nenhum no longo prazo. Uma parcela ínfima do eleitorado viaja de avião. No fundo, o saldo para os partidos será talvez apenas uma degradação maior da imagem dos políticos como um todo. Tudo somado, péssimo para a democracia."

Post 100

Quatro meses depois de lançar este blog chegamos ao post 100! Nem eu acredito que consegui chegar a esta marca. Mas está sendo muito divertido, enriquecedor e espero que esteja fazendo a diferença para algumas pessoas. Obrigado pela paciência e continuem prestigiando o Branas.

terça-feira, 24 de julho de 2007

A mídia aproveita-se da fogueira parte 2

Estou muito preocupado com a toada irresponsável que certos setores da mídia e da elite deste país estão produzindo após o trágico acidente com o avião na TAM. Estão querendo colocar o governo contra a parede. Isso no mínimo. Agora a troco de quê, não sei. Não que este governo seja uma maravilha. Está longe disso, mas também está muito distante do grau de incompetência e desonestidade que querem lhe atribuir.

Acho que realmente a hipótese mais certa para a motivação desta campanha seja o inconformismo de alguns setores com a alta popularidade do presidente, mas só este fator não explica tudo. Enquanto isso, somos conduzidos como massa de manobra. Temos que tomar cuidado e não se deixar envolver por esta histeria coletiva provocada artificialmente.

O que me consola é que não sou o único que pensa assim. Outros blogs (sim, vida inteligente e informação de qualidade só mesmo nos blogs) vão desnudando este Carnaval fora de época em que vivemos. Vejam abaixo alguns deles e links para os posts:

No blog do Luis Nassif há uma texto muito curioso que mostra bem a má vontade que existe hoje contra este governo e como na época do FHC o tratamento era diferente. Havia muito mais condescendência. Vcs vão entender o que eu quis dizer com "curioso" depois de ler tudo até o final.

Já o blog do Mino Carta vai mais longe e mostra em um post como os fatos atuais remetem para um passado tenebroso que, infelizmente, já presenciamos em nosso país.

Paulo Henrique Amorim vai mais longe e diz em seu blog que "o golpe consiste em derrubar o Presidente Lula ou torná-lo impotente. De modo que a experiência de o Brasil eleger um presidente pobre, nordestino e de “esquerda” jamais se repita.""..É provável que a mídia conservadora (e golpista) consiga levar o golpe até o fim..."

A jornalista Helena Chagas mostra em seu blog como oposição (principalmente) e governo tentam utilizar o acidente da TAM para a guerra política. E tudo com a ajuda "inestimável" da mídia. Em outro post ela matou a pau a questão e finalizo este blog com a íntegra da análise:

A maior vítima do jogo de empurra é a verdade
Está acontecendo uma coisa muito estranha nas investigações do acidente com o airbus da TAM.Não existe ainda uma explicação com começo, meio e fim. Mas cada dado, cada pista que vaza é usado politicamente. Por exemplo: o pessoal da oposição fica satisfeito toda vez que parece que a culpa é da pista de Congonhas. Por que?Porque aí eles podem responsabilizar o governo federal pela liberação da pista sem ranhuras e pelo uso em dia de chuva. Já o outro lado festeja todos os indícios de que a causa foi falha mecânica. Porque aí a maior culpa não é do governo, é da TAM. Ora, nesse jogo de empurra, só tem um perdedor: a verdade. Investigação não pode ter lado. E é uma investigação isenta que as autoridades, o governo, a oposição - o país inteiro - devem aos mais de duzentos mortos de Congonhas.

Um debate sobre sustentabilidade

Postaram como comentário neste blog um convite para uma palestra gratuita sobre sustentabilidade que deve ocorrer no instituto Alumni da Chácara Santo Antonio no dia 31 de julho. Estarão presentes o fotógrafo Pedro Martinelli, consagrado por seu trabalho na Amazônia - ele passa mais tempo vivendo lá do que em SP, e o ex-secretário do meio-ambiente, Fábio Feldmann. Não sei se vou conseguir ir, mas se fosse iria para ouvir o que o Pedrão tem para falar. O tema dele parece ser bem interessante. Ele vai explicar criticamente como se faz o tal manejo sustentável (na minha modesta opinião mais um dos mitos como a sustentabilidade). Enfim, abaixo o convite e as outras informações sobre o evento.

CONTEMPORARY BOUTIQUE
Ciclo de debates sobre temas de grande relevância na sociedade contemporânea, com participação de professores, profissionais e estudantes, que apresentam seus pontos de vista e discutem o impacto dessas tendências no dia-a-dia de cada um de nós.Nosso terceiro encontro, o tema debatido será: SUSTENTABILIDADE

DEBATEDORES
PEDRO MARTINELLI" O tão falado manejo sustentavel é pura ficção. Eu estive lá e vi! Isto é manejo sustentavel?"
FABIO FELDMANN“Sustentabilidade - Estratégia indispensável para salvar o futuro da humanidade”
MEDIADOR - Jayme Costa PintoData: 31/07
Horário: das 19h30 às 22h
Local: Centro Cultural Alumni – Rua Brasiliense, 65 – Chácara Santo Antônio
Estacionamento: Serviço de valet gratuito
Entrada gratuita. Reservas pelo telefone 11 5644-9774 ou por e-mail cultural@alumni.org.br

domingo, 22 de julho de 2007

A mídia aproveita-se da fogueira

Este é o título do editorial do jornalista Mino Carta na revista Carta Capital desta semana. Mais um texto exemplar que mostra como a mídia e parte da elite deste país adoram deformar a opinião pública visando seus próprios interesses. O que foi feito no acidente da TAM, com um julgamento apressado contra o governo, chega a ser criminoso. É muito bem orquestrado para ser apenas mau jornalismo. A cobertura teve que encontrar seu eixo depois da revelação de que o avião estava com um dos reversos inoperante. E o que faz a mídia? Para não dar o braço a torcer, fica de campana e conseguiu gravar uma cena privada dentro do Palácio do Planalto. E dá-lhe porrada...Se isso não é campanha, então não sei mais o que é jornalismo isento. E por que estão todos contra Lula? Reportagem na mesma revista mostra o motivo: o índice de popularidade do presidente está cada vez maior (supera até mesmo 2003). Ou seja, o presidente pode ser um importante cabo eleitoral no próximo pleito (isso se não permitirem mais uma reeleição). Por isso, o desespero desta gente contra o atual governo. Abaixo a integra do editorial.


A mídia aproveita-se da fogueira
por Mino Carta
Como sempre, todos contra o governo, na busca sôfrega de uma crise. Tudo serve, até a tragédia de Congonhas

Um colunista da Folha de S.Paulo afirma na primeira página que o “nome certo” da tragédia de Congonhas “é crime”. E o criminoso? Obviamente, trata-se do governo do ex-metalúrgico alçado a uma função superior às suas forças.
Creio que, antes de um julgamento final, seria oportuno apurar com precisão as causas do acidente, como de resto convém à prática do melhor jornalismo. Mesmo assim o colunista propõe a seguinte manchete: “Governo assassina mais de 200 pessoas”.
É inegável, isto sim, a omissão governista em relação à insegurança do Aeroporto de Congonhas. Todos o sabemos mal situado e pessimamente usado. Em outros países, aeroportos como o paulistano ou foram suprimidos ou destinados a operações de porte restrito.
Se Congonhas, pelo caminho oposto, cresceu em pretensão e alcance, isto se deve, em primeiro lugar, ao lobby das companhias aéreas, à prepotência da Infraero e à condescendência da Anac que não encontraram a devida resistência do governo, quando não a firme intervenção para pôr as coisas no lugar certo.
Reconheça-se que Lula tem sido leniente em relação a interesses diversos que não coincidem em absoluto com aqueles do País e do seu povo. A capa de CartaCapital da semana passada aponta omissões e concessões recentes. Não sei porém se a indignação do colunista da Folha seria igual se, nas mesmas circunstâncias, o presidente fosse algum tucano DOCG (denominação de origem controlada e garantida). Digamos, Fernando Henrique, ou, melhor ainda, José Serra. Tudo serve na busca sôfrega de uma crise.
Neste rumo a mídia malha a situação e poupa a oposição, com empenho e desfaçatez dignos da medalha de ouro, recordista mundial. E me permito contar um episódio que remonta à segunda 16, e que não foi registrado por jornal algum, ou por qualquer órgão midiático.
O governador do Paraná, Roberto Requião, naquela tarde visita o presidente Lula no Palácio do Planalto, para um encontro como de hábito cordial. Em seguida, o governador, em toda a sua corajosa imponência, dirigi-se ao Comitê de Imprensa do próprio Palácio.
Requião tem sido um dos alvos preferidos dos ataques da mídia. Suas relações com os jornalistas são tensas, mas ele não hesita na provocação, e pergunta por que, em outros tempos, “vocês não falaram do filho de Fernando Henrique?” Mais um rebento fora do matrimônio, como no caso de Renan Calheiros. A aventura de FHC, do conhecimento até do mundo mineral, é anterior à sua primeira eleição em 1994, e a jovem brindada pelos favores do príncipe dos sociólogos foi mais uma jornalista em atividade em Brasília, Miriam Dutra.
A pergunta de Requião deixa os credenciados do comitê entre atônitos e perplexos. Alguém balbucia que a comparação não cabe, os casos são diferentes. Impávido, o governador ergue o sobrolho e clama: “Por quê?” Logo explica: “Quem sustentou o filho do ex-presidente foi, desde o nascimento, uma empresa privada, a Globo da família Marinho”.
A bem da tranqüilidade familiar de FHC, e do seu desempenho na Presidência, Miriam Dutra e seu filho foram enviados ao exterior, no resguardo. Consta que voltaram para o País faz pouco tempo. Fez-se o silêncio no comitê, e o governador se foi, a dar risadas.
Agora, sou eu quem pergunta: alguém leu, ou ouviu, relato desse episódio? E então, volto à carga: qual é o país do mundo que se diz democrático, e goza de liberdade de expressão, onde um governador de estado, ou qualquer figura pública importante, fala de um ex-presidente da República igual a Requião, diante de uma matilha de perdigueiros da informação, e a mídia fecha-se em copas? Não conheço outro, além do Brazil-zil-zil.

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Tristeza? Joseph Campbell nela!

Ando me sentindo um pouco deprimido, triste, angustiado. Como Nietzsche explica bem, não há conquista sem sofrimento e acho que estou passando justamente por este momento. Enfim, para escapar desta depressão sempre recorro aos sábios e um deles é Joseph Campbell. Você pode olhar aí no canto superior direito uma singela homenagem deste blog a este importante pensador. A frase capta bem o sentimento de buscar a bem-aventurança. Onde ela estiver. Quem acompanha o Branas sabe que um dos assuntos recorrentes aqui é este tema (que pode ser melhor entendido ao ler os posts no marcador Jornada e bem-aventurança) .

Bom, estou aqui longe da minha biblioteca, confinado a uma trincheira com quatro paredes e um computador e tentando resolver todos os abacaxis possíveis. Dei um google para encontrar algum texto sobre e de Joseph Campbell para tornar alguns minutos deste dia um pouco mais prazerosos. Acabei esbarrando em uma reportagem antiga da revista Vida Simples que mencionava o autor de O Herói das Mil faces. A alentada matéria de junho de 2004 é bem didática e conta muito sobre a vida dele e os conceitos principais de sua obra. Vale conferir neste link http://vidasimples.abril.com.br/livre/edicoes/017/04.shtml . O final do texto é muito bom e reproduzo aqui o parágrafo inteiro:

"O que é bem-aventurança
Conceito central no pensamento de Campbell, a bem-aventurança, diz ele, está naquilo que nos enche de satisfação e entusiasmo e dá aquele sentimento de estar realmente vivo. E essa busca não é o mesmo que ir atrás de felicidade. Pelo contrário: a jornada tem sofrimento, armadilhas e monstros terríveis. Mas é o que vai fazer, enfim, o herói completar sua transformação para encontrar a dádiva final. Ulisses, o herói da Odisséia, não sai em uma jornada de aventuras porque é a opção que lhe parece a mais feliz. Pelo contrário, ele só parte porque não consegue evitar - ele até finge estar louco para ver se escapa. No final não consegue evitar o chamado, deixa a vida feliz e a amada Penélope para sair em uma longa viagem. Só depois de enfrentar ciclopes, sereias e outros tantos perigos e tentações volta vitorioso para os braços da fiel Penélope. "

Veja abaixo outros links para posts sobre Joseph Campbell, O Poder do Mito e a bem-aventurança:
Especial de sexta
Em busca da bem-aventurança
Mais bem-aventurança

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domingo, 15 de julho de 2007

Nietzsche e o valor da dificuldade

Na busca de levar a filosofia para perto do cidadão comum, Alain de Botton em As Consolações da Filosofia sempre tenta apanhar um conceito mostrado por um pensador famoso. No caso de Friedrich Nietzsche era a idéia de que só o esforço, as dificuldades, os contratempos, o medo, o sofrimento, poderiam valorizar uma conquista. Ou ainda: "o ser humano só conseguia atingir uma vida plena depois de passar por períodos de grande infortúnio"


Nas palavras de Botton, "os mais satisfatórios projetos humanos pareciam inseparáveis de um grau de tormento; estranhamente, as origens de nossas maiores alegrias pareciam residir junto àquelas de nossos maiores sofrimentos". Nietzsche fazia uma analogia interessante: "...se uma árvore que deve alcançar uma altura invejável pode prescindir do mau tempo e das tempestades e se o infortúnio e a resistência externa, alguns tipos de ódio, a inveja, a obstinação, a desconfiança, a insensibilidade, a avareza e a violência fazem, ou não, parte das condições favoráveis sem as quais qualquer grande progresso, mesmo o da virtude, quase nunca é possível".

Botton explica que "no intervalo entre o fracasso inicial e o sucesso subseqüente, no espaço de tempo que separa a pessoa que um dia queremos ser e a que somos no momento, devem vir a dor, a ansiedade, a inveja e a humilhação. Nós sofremos porque não conseguimos espontaneamente conhecer a fundo os ingredientes da satisfação. Nietzsche esforçava-se para retificar a crença de que a satisfação ou é facilmente obtida ou jamais nos bate à porta, uma crença de efeitos nocivos por nos induzir a desistir prematuramente dos desafios que poderiam ter sido vencidos se ao menos nos tivéssemos preparado para as batalhas que praticamente tudo que é valioso tem o direito de exigir"

Justamente por evitar esta realidade e permitir o comodismo é que Nietzsche abominava o álcool e o cristianismo. "Os dois grandes narcóticos europeus, o álcool e o cristianismo", afirmava o filósofo. "Tanto um quanto o outro têm o poder de nos convencer de que são verdadeiras as deficiências que, em nosso íntimo, previamente julgávamos possuir e que o mundo não requer atenção; ambos enfraquecem nossa decisão de cultivar nossos problemas; ambos nos negam a chance de satisfação", explica Botton.

"Para Nietzsche os adeptos da religião do comodismo, os cristãos, em sua escala de valores, haviam dado prioridade ao que era fácil, não ao que era desejável, e desta forma drenaram o potencial da vida", finaliza Botton.

terça-feira, 10 de julho de 2007

O Segredo na Galileu

Antigamente a revista Superinteressante conseguia surpreender e antecipar pautas e tendências. Foi assim que surgiram capas matadoras, como a de Buda e Matrix, ou a criação da Vida Simples. Mas a revista perdeu fôlego e se burocratizou. Abriu espaço para a Galileu que na edição deste mês traz ampla reportagem sobre O Segredo. Tudo bem, também demorou para ir atrás deste assunto, mas pelo menos fez alguma coisa.

Li a matéria e foi visível o esforço de tentar levar em consideração todos os lados da questão. Óbvio que o lado "científico" falou mais alto e muitas das teorias apresentadas no filme e no livro são descartadas por cientistas e pesquisadores "sérios". Além disso, a reportagem desdenha perigosamente dos efeitos da vibração. Já disse isso aqui no Branas, mas a noção de Tudo Vibra vai desde o antigo e metafísico Caibalion até a sofisticada matemática da Teoria M. Ou seja, é coincidência demais todo mundo, dos mais variados setores, mencionar esta possibilidade. Um dia alguém vai descobrir como isso funciona na prática, mas o jornalista não viu este aspecto da questão.

Nem cita A Física da Alma de Amit Goswani, que poderia ser um importante contraponto para a física quântica e a consciência, tampouco viu O Ponto de Mutação, de Frijof Capra, no qual mostra que a visão mecanicista a partir de Descartes arruinou nossa sensibilidade e nos enjaulou neste tempo e espaço em que vivemos. Se tivesse lido, não seria tão duro com as idéias de uma visão mais próxima da natureza e que estamos todos interligados, como os antigos, com suas práticas pagãs, e os animistas (a natureza tem alma) acreditavam.

Um dos pontos positivos da reportagem é a análise de como O Segredo conseguiu este sucesso todo. "Tanto naquele tempo (século 19) quanto hoje, há uma categoria de céticos que gostariam de acreditar numa mudança possível, mas para quem o lado esotérico da religião não fornece as respostas mais convenientes. Para chegar a eles, alguns autores queriam - e continuam querendo - mostrar que a auto-ajuda pode não ser uma questão de fé, mas sim algo diferente e que pode ser comprovado objetivamente..."

O artigo cita o antropólogo inglês Andrew Dawson, da Universidade de Lancaster, "As pessoas da nossa época são fascinadas com a ciência. Ela é vista como a aplicação prática de um conhecimento que é altamente eficiente e que proporciona sempre o efeito desejado. Os adeptos da new age acreditam que, se realizarem corretamente certos rituais e práticas específicos, encontrarão as respostas pelas quais procuram. A ciência oferece à new age um modelo no qual se espelhar".

Enfim, mesmo com as lacunas e um tremendo viés cartesiano, não deixa de ser uma reportagem interessante e que ajuda a debater este fenômeno que é a Lei da Atração e o O Segredo.

Leia outros posts sobre este assunto:
Lei da Atração - primeira parte
Lei da Atração 2
Lei da Atração 3
Você acredita na Lei da Atração?
Alimente os Grandes Sonhos
Lei da Atração na prática
Ainda O Segredo - sobre a reportagem na Veja
Tudo vibra
O Caibalion


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segunda-feira, 9 de julho de 2007

Você está disposto a mudar?

Este é o título de umas das reportagens do excelente especial Como deter o aquecimento Global, da revista Scientific American Brasil (R$ 12,90 em bancas e revistarias). Material profundo, porém com linguagem bem acessível, e indispensável para quem quer saber mais sobre o assunto. O artigo do jornalista Fernando Pachi toca em um ponto que este blog vive mencionando aqui: temos que parar de consumir. "Para modificar hábitos, é preciso abrir mão de confortos que prejudicam o ambiente, e negociar a distribuição dos sacrifícios", diz a abertura da reportagem. Mexeu na ferida.

"A verdade é que muitos ainda se perguntam se podem mesmo fazer algo para salvar o planeta, atribuindo os problemas ambientais à sociedade, aos governos ou a qualquer instância supostamente exterior a nós mesmos", diz o jornalista. Ou seja, o problema nunca é com a gente. Gostamos mesmo é de nos enganar e achar que a solução do aquecimento global é problema dos outros. Sacrifícios? Nem pensar!

Mas o fato é que já passamos há muito tempo do ponto de equilíbrio entre consumo e recursos naturais. A matéria é pródiga em trazer números assustadores: " Na década de 60, cada habitante do planeta tinha 6 hectares de terras produtivas disponíveis para atender suas necessidades. Atualmente, esse número é de 1,3 hectare. Em 2050, chegará a 0,9 hectare, para uma população mundial de cerca de 10 bilhões de habitantes.... Se o consumo e a degradação continuarem neste ritmo, em 2050 precisaremos de três planetas Terra para dar conta do nosso estilo de vida. Por isso, precisamos equilibrar o consumo e reduzir os resíduos".

Pior é que ninguém se dá conta disso e quer aumentar seu padrão de vida e de consumo. "Cálculos de ecologistas demonstram que, se a população do mundo consumisse tanto quanto os americanos, seriam necessários mais quatro planetas para que dispuséssemos de água, energia, alimentos, produtos e serviços básicos"

Portanto, se você ainda é um daqueles que acreditam em sustentabilidade, acorde! "Seria muita fé na tecnologia e "tolerância" do planeta acreditarmos que o tal desenvolvimento sustentável criado no plano político para apaziguar os múltiplos interesses econômicos que rondam a questão ambiental, se realize de fato em todo o planeta. O sistema econômico atual permite que os principais agressores do meio ambiente arquem com pouco prejuízo derivado de sua ação. Neste ponto, a ação dos indivíduos dificilmente poderá deter o processo de degradação se ela mesma não deixar de legitimar esse sistema econômico..."

E para isso ocorrer só com mobilização popular. " A grande discussão é como "religar" os indíviduos à política e o Estado à sociedade...Causas ambientais sensibilizam. A questão é saber se são capazes de congregar...e quais espaços desejam conquistar ", finaliza ele.

Enfim este é um resumo da reportagem deste belo especial. Uma pena que material tão importante não esteja disponível para todos na internet. O artigo ainda menciona dois links interessantes e que valem uma espiada:

Verifique o que consumir sem consumir o mundo: www.akatu.net
Calcule seu impacto sobre o meio ambiente: www.ecologicalfootprint.org

sábado, 7 de julho de 2007

Aviso aos navegantes

Duas notícias rápidas. Já chegou às bancas o segundo e último DVD Filosofia para o dia-a-dia. Alain de Botton agora nos fala de Sócrates, Epicuro e Nietzsche. Vale a pena. Depois vejam alguns posts neste blog no marcador filosofia onde abordo este assunto e menciono algumas passagens do programa e do livro Consolações da Filosofia, do mesmo Botton e que inspirou o DVD.
A segunda nota é que nossos amigos do site Saindo da Matrix revelam que estará no Brasil em agosto o físico Amit Goswami, autor de A Física da Alma e personagem principal do filme Quem Somos Nós. Os detalhes sobre a visita podem ser lidos aqui.

quarta-feira, 4 de julho de 2007

A cana avança...

Reportagem no Estadão de hoje revela que a plantação de cana-de-açúcar começa a roubar área de plantio de lavouras como milho, soja e trigo. E isso no Brasil! Ou seja, os piores temores de quem criticava o biocombustível por substituir produção de alimento por combustível estão chegando mais cedo que todos imaginavam. Ainda me lembro de uma reportagem da Exame que citamos aqui (ler post) em que o esforço era mostrar que no Brasil este problema não ocorreria, só nos Estados Unidos. E agora? Qual vai ser a desculpa? Pior é que com a chegada da cana, a soja vai ter que conquistar seu espaço após a fronteira agrícola atual. Ou seja: mais desmatamento na Amazônia. Lindo, não? Registre nos autos o meu mantra: este negócio de biocombustível e sustentabilidade é lorota. Temos é que parar de consumir como um bando de gafanhotos famintos. Abaixo trechos do texto publicado no jornal:



O diretor de Logística e Gestão Empresarial da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Sílvio Porto, admitiu que a cana-de-açúcar está tomando espaço do milho e da soja em Mato Grosso do Sul, no Paraná e em Minas Gerais. É a primeira vez que um técnico do governo reconhece a pressão exercida pela expansão da cana para áreas produtoras de grãos. O alerta foi feito, durante a divulgação do 10º Levantamento da Safra 2006/07.

A entrada da cana de forma mais efetiva no Centro-Oeste poderá voltar a causar nova pressão na região da Amazônia Legal por novas áreas agrícolas ou áreas de pastagens."Efetivamente, a cana está tomando área do milho e da soja", disse Porto. Ele considera que o zoneamento agrícola é fundamental para o planejamento da ocupação do espaço agrário no Brasil. No caso do trigo, Porto destacou a redução no plantio do cereal no Paraná, maior produtor nacional, por causa da substituição de parte da área por milho, que tem preços mais vantajosos, e pela cana.

"Já existe uma concorrência efetiva - nesse caso, negativa - em relação ao milho no Paraná, onde a cana está absorvendo parte dessa área. É preocupante um produto da agroenergia avançar sobre um produto tão importante na alimentação brasileira", explicou ele.Os dados do último levantamento da Conab para a cana-de-açúcar, de maio, apontam a expansão da cultura na comparação da atual safra ante 2006/07: em Minas Gerais houve aumento de 16,8% na área plantada; em Mato Grosso do Sul, 18%; e no Paraná, 25%. O próximo levantamento deve sair em outubro, em meados da safra no Centro-Sul, que se encerra em novembro.

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terça-feira, 3 de julho de 2007

Schopenhauer e o amor

Voltemos aos nossos posts filosóficos. Agora é a vez de Arthur Schopenhauer. No livro que não canso de mencionar "As Consolações da Filosofia", de Alain de Botton, há um capítulo dedicado a este pensador nascido na Polônia, mas que passou grande parte de sua vida na Alemanha. Schopenhauer tinha uma idéia curiosa sobre o amor. Para ele a paixão acomete os seres humanos com um único propósito inconsciente: perpetuar a espécie. "O momento em que o amor - ou, para ser mais exato, o desejo - entre duas pessoas começa a florescer deve, na realidade, ser encarado como o primeiro passo para a formação de um novo indivíduo", diz ele.

Prossegue Schopenhauer: "Há algo de bastante peculiar na seriedade profunda e inconsciente com que um jovem casal observa um ao outro no primeiro encontro. A troca de olhares sutis e perscrutadores, a cuidadosa inspeção mútua da aparência, o exame rigoroso de todos os traços que compõem cada individualidade nada mais é do que a meditação do espírito, a indagar sobre a viabilidade de ser gerado um novo ser humano"

Portanto, quando estamos atrás do nosso par ideal buscamos na verdade evidências de que teremos uma prole saudável. Não é genial? Mas o melhor está por vir. Segundo Schopenhauer, há um efeito colateral nesta história toda. Somos totalmente ludibriados ao escolher o parceiro a partir das premissas de geração de filhos saudáveis. Achamos que encontramos o par perfeito, mas na verdade nosso interesse é outro. E mais tarde podemos perceber o erro que cometemos. Nas palavras de Alain de Botton:

"...a pessoa que escolhemos como sendo a mais indicada para ter um filho conosco quase nunca é a mais indicada para nós (embora sejamos incapazes de perceber isto no momento que a escolhemos porque a vontade de viver nos ofuscou o raciocínio). " Conseguir que a conveniência e a paixão caminhem de braços dados é o mesmo que receber o mais raro bafejo da sorte", observou Schopenhauer. "

"O parceiro amoroso que livra nosso filho de nascer com um queixo protuberante ou uma índole efeminada não costuma ser a mesma pessoa que nos fará feliz por toda a vida. A busca da felicidade pessoal e da geração de filhos saudáveis são projetos radicalmente opostos que o amor maliciosamente nos confunde e nos leva a pensar que se tratam de um só por um bom número de anos. Não deveríamos nos surpreender com o casamento entre duas pessoas que jamais teriam sido amigas uma da outra. "

Ainda Schopenhauer: " O amor...lança-se sobre as pessoas que fora da relação sexual, seriam detestáveis, desprezíveis e mesmo repugnantes como amantes. A vontade de perpetuação da espécie é tão mais poderosa que a do indivíduo que faz o apaixonado fechar os olhos para todas as qualidades que lhe são repugnantes, tudo tolera, tudo distorce, e acaba por unir-se para sempre ao objeto de sua paixão. Ele se mostra, desta forma, completamente enfeitiçado por uma ilusão, que se desfaz tão logo o desejo de perpetuação da espécie seja satisfeito, mas deixa como herança um cônjuge detestável para o resto da vida..."

Botton finaliza com a seguinte alegoria: Então, um dia, uma mulher com ares de rapaz e um homem com ares de moças irão se aproximar do altar por motivos que nenhum dos dois, ou qualquer outra pessoa, possa ter imaginado...Apenas mais tarde, quando as necessidades da vontade forem satisfeitas e um garoto robusto estiver brincando com sua bola em um quintal de subúrbio, o ardil será descoberto. O casal se separa ou passará a dividir a mesa do jantar em meio a um silêncio hostil" . Como diz Schopenhauer, "a geração futura é providenciada à custa da geração atual".

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segunda-feira, 2 de julho de 2007

Lester Brown e os biocombustíveis

Este blog vem falando faz tempo que esta história de biocombustível e sustentabilidade é tudo conversa para boi dormir. Estamos apenas empurrando para debaixo do tapete nossa sujeira (ver posts anteriores no marcador sustentabilidade). O que temos que fazer é parar de consumir!

Agora é a vez de um dos mais famosos ambientalistas se levantar contra esta pseudo "salvação da pátria" que querem nos colocar goela abaixo. Lester Brown é uma referência internacional na área ambiental e seu livro "Estado do Mundo" é obra obrigatória entre os que estudam o tema.

Ele concedeu uma entrevista ao jornal Folha de S. Paulo desta segunda-feira em que joga luzes em várias questões, uma delas é que os biocombustíveis são a maior ameaça à diversidade na Terra. Por se tratar de um material muito importante, vou colocar abaixo a entrevista na íntegra. Leiam com calma e reflitam. Principalmente nos temas relacionados à China:


ENTREVISTA/LESTER BROWN

A AMBIÇÃO BRASILEIRA de criar um mercado mundial para o álcool em parceria com os EUA encontrou um opositor de peso em um dos pioneiros do movimento ambientalista: o americano Lester Brown, 72, com influência suficiente para ser ouvido no Congresso dos EUA, no Fórum Econômico Mundial ou na Academia de Ciências da China. Ele diz que o uso do milho por usinas de álcool desencadeou uma disputa de proporções épicas entre os 800 milhões de donos de carros e os 2 bilhões de pessoas mais pobres do planeta.

O aumento da demanda por milho para fabricação de álcool tem levado à inflação de alimentos em todo o mundo, diz Brown, com efeitos perversos para a população mais pobre. A posição é semelhante à do ditador cubano Fidel Castro e do presidente venezuelano, Hugo Chávez, que vêem nos biocombustíveis uma ameaça à oferta de alimentos no mundo. A tecnologia brasileira de fabricação de álcool a partir da cana-de-açúcar não escapa das críticas do ambientalista. "Se eu tivesse que identificar a mais importante ameaça à diversidade biológica da Terra, ela seria a demanda crescente por biocombustíveis", disse Brown em entrevista por telefone. O ambientalista afirma que a Terra não terá como acomodar milhões de chineses com o mesmo padrão de consumo dos norte- americanos. Se crescer a 8% ao ano, afirma, a China terá em 2031 renda per capita igual à dos Estados Unidos hoje. Caso os chineses do futuro consumam como os americanos de hoje, o país asiático terá 1,1 bilhão de carros em 2031, mais que os 800 milhões existentes hoje no mundo. Para alimentar sua frota e seu crescimento, precisará de 99 milhões de barris de petróleo/dia, mais que a produção mundial atual, de 85 milhões de barris/dia.

FOLHA - O sr. tem uma posição distinta da maioria dos ambientalistas em relação ao uso do álcool como combustível. Por quê?
LESTER BROWN - Muitos ambientalistas estão mudando de posição em relação a essa questão. O cenário de um ano atrás não é mais o mesmo hoje, pelo menos não nos Estados Unidos. Se utilizarmos quantidades crescentes de grãos para dar combustível aos carros, isso levará à alta no preço de alimentos e será uma ameaça à população mais pobre do planeta. Os ambientalistas estão retirando apoio ao álcool e falando em carros híbridos [movidos a gasolina e eletricidade] que podem ser recarregados em uma tomada, vistos cada vez mais como a solução para os Estados Unidos. O Toyota Prius é o carro híbrido mais popular nos Estados Unidos. Se for agregada a ele uma segunda bateria com tomada, será possível recarregá-la à noite em casa. Com isso, os percursos de curta distância seriam realizados totalmente com eletricidade. Se fizermos isso nos Estados Unidos, poderemos reduzir nosso consumo de petróleo em cerca de 80%. Se, ao mesmo tempo, investirmos em centenas de usinas eólicas [movidas a vento], agregaríamos energia barata à nossa rede de transmissão, o que nos permitiria ter energia equivalente a um galão de gasolina por US$ 1. Está surgindo uma grande coalização entre companhias de eletricidade, corporações, ambientalistas e governos municipais e estaduais para encorajar a adoção desse caminho.

FOLHA - O sr. fala em um "confronto épico" entre os 800 milhões que têm carros e as 2 bilhões de pessoas mais pobres do mundo, que vêem os preços dos alimentos subirem. Os vencedores desse confronto, pelo menos até agora, parecem ser os 800 milhões de motorizados, considerando os pesados investimentos na produção de álcool.
BROWN - Por enquanto, os 800 milhões têm sido vitoriosos, porque houve enormes investimentos em usinas de álcool nos Estados Unidos. A capacidade de produção em construção é maior que a capacidade de todas as usinas criadas desde o início do programa [de fabricação de álcool], em 1978. Até o fim do próximo ano, quase 30% da colheita de grãos irá para usinas de álcool, reduzindo a quantidade disponível para exportações. Como o mundo depende fortemente dos Estados Unidos, que é um dos maiores exportadores de milho e de trigo, isso vai criar problemas graves aos importadores de grãos, como Japão, Índia, Egito, Nigéria, México.

FOLHA - A recente inflação nos preços de alimentos no mundo pode ser atribuída ao álcool? BROWN - Há outros fatores, como falta de água, mas a causa principal da inflação nos últimos seis meses tem sido o aumento no preço de grãos. Isso ocorre em todos os lugares do mundo: no preço do porco na China, da tortilha no México, da cerveja na Alemanha.

FOLHA - Com tantos investimentos no setor, é possível uma reversão no uso de álcool nos Estados Unidos?
BROWN - Ninguém sabe. O que começamos a ver é uma reação dos consumidores. Estamos em uma situação inusual, na qual subsidiamos a alta do preço de alimentos. Como contribuintes, estamos dando os subsídios que vão para a produção do álcool. Perdemos nas duas pontas, como contribuintes e como consumidores.

FOLHA - Além disso, a produção de álcool com milho é pouco eficiente.
BROWN - Sim, especialmente se comparado ao álcool produzido por cana-de-açúcar. Para cada 1 unidade de energia usada na produção de álcool a partir do milho, é obtida 1,3 unidade de energia, o que dá um ganho de 30%. No caso da cana-de-açúcar, para cada 1 unidade de energia utilizada, são obtidas 8 unidades de energia.

FOLHA - O álcool produzido a partir da cana-de-açúcar é uma opção viável aos combustíveis fósseis?
BROWN - Poderia ser nos países que podem plantar cana-de-açúcar. Nós não podemos plantar muito, porque estamos no hemisfério Norte. Mas, se países que já são grandes produtores, como o Brasil, tentarem satisfazer não apenas seu mercado interno mas também exportar, haverá desmatamento, pela expansão da produção de cana-de-açúcar ou porque a expansão da cana toma espaço de outras culturas, como soja [que ocupariam outras áreas]. A preocupação que está emergindo na comunidade internacional de ambientalistas em relação aos biocombustíveis é o efeito que eles estão tendo no desmatamento na Amazônia brasileira e no sudeste asiático, onde Malásia e Indonésia são os principais produtores de óleo de palmeira, que é usado como biodiesel. Se eu tivesse que identificar a mais importante ameaça à diversidade biológica da Terra, ela seria a demanda crescente por biocombustíveis -álcool no caso do Brasil ou biodiesel no caso do sudeste asiático. Eu não diria que o Brasil deve interromper sua produção de álcool. A minha sugestão é que o Brasil comece a desenvolver outras fontes de energia, incluindo a solar e a eólica, em que tem grande potencial.

FOLHA - A China acaba de superar os Estados Unidos como o maior emissor de gases de efeito estufa. A Terra é grande o bastante para acomodar os milhões de emergentes consumidores chineses?
BROWN - Eu sempre escutei que os Estados Unidos, apesar de terem apenas 5% da população mundial, consumiam quase 40% dos recursos da Terra. Isso não é mais verdadeiro. A China hoje consome mais da maioria dos recursos básicos do que os Estados Unidos, com exceção de petróleo. O consumo de carne da China hoje é o dobro do registrado nos Estados Unidos. O de aço é o triplo. O que acontecerá se a China alcançar os Estados Unidos em consumo per capita? Se o crescimento chinês se reduzir para 8% ao ano, em 2031 a renda per capita da China será a mesma da dos Estados Unidos hoje [com valores ajustados pela Paridade do Poder de Compra]. Se os chineses tivessem o mesmo padrão de consumo dos americanos, em 2031 a população de 1,4 bilhão ou 1,5 bilhão da China consumiria o dobro da atual produção de papel de todo o mundo. Se houver três carros para cada grupo de quatro pessoas, como nos Estados Unidos hoje, a China teria 1,1 bilhão de carros. Em todo o mundo hoje há 800 milhões. O consumo de petróleo seria de 99 milhões de barris ao dia. A produção atual de petróleo é de 85 milhões de barris por dia. O que a China está nos ensinando é que o modelo econômico ocidental, centrado em combustíveis fósseis, no uso de carros e no desperdício, não vai funcionar para o país. Se não funcionar para a China, não vai funcionar para a Índia, que em 2031 deverá ter uma população maior que a da China. Há 3 bilhões de pessoas nos países em desenvolvimento sonhando o sonho americano.

FOLHA - A questão é essa: todos sonham o sonho americano.
BROWN - Sim, e em uma economia cada vez mais integrada, na qual todos nós dependemos dos mesmos grãos, petróleo e aço, esse modelo também não vai funcionar para os países industrializados. O que temos que fazer é pensar em uma nova economia, com fontes renováveis de energia, que tenha um sistema de transporte diversificado e que reúse e recicle tudo.

FOLHA - Há disposição entre os líderes chineses para mudar o padrão de desenvolvimento do país?
BROWN - Eles publicam quase tudo o que eu escrevo. O primeiro-ministro Wen Jiabao começou a me citar em alguns de seus discursos. As coisas mais estimulantes que aconteceram em energia renovável nos últimos anos aconteceram na China. Até o fim deste ano, 40 milhões de casas terão água aquecida por energia solar, captada por painéis colocados nos telhados das casas, e o número deve quadruplicar até 2020.

FOLHA - É possível para a China mudar o padrão de desenvolvimento e caminhar na direção de fontes renováveis de energia sem sacrificar o crescimento econômico?
BROWN - Se não reestruturarmos a economia mundial, o crescimento econômico será insustentável. Precisamos reestruturar a economia muito mais rapidamente do que a maioria das pessoas imagina.Os números que mencionei sobre a China como nação consumidora se referem a 2031, quando eles estariam consumindo mais recursos do que o mundo possui.Se não reestruturarmos a economia no mundo, o progresso econômico provavelmente não se sustentará.