segunda-feira, 4 de junho de 2007

Maus efeitos da riqueza

Sêneca continua me surpreendendo. No livro "Da tranqüilidade da alma" ele aborda os efeitos nocivos da riqueza e da ostentação frívola (alguma semelhança com nossos dias consumistas de hoje?). Alguns trechos do capítulo "Maus efeitos da riqueza":

" Passemos ao domínio das riquezas, principal fonte das misérias dos homens, pois, comparando-se todos os nossos outros perigos, prazeres, doenças, temores, desgostos, sofrimentos e preocupações de toda espécie, com os males que nascem do dinheiro, será deste lado que muito claramente penderá a balança....

...O dinheiro se apega tão intimamente à alma, que não se pode arrancá-lo sem dor. É, aliás, eu o repito, mais suportável e mais simples nada adquirir do que perder alguma coisa. Daí vem que se vê um ar mais alegre nas pessoas que a fortuna jamais visitou do que naquelas que ela traiu...Limitemos ao menos a extensão de nossos bens, a fim de estarmos menos expostos às injúrias da fortuna...Para o dinheiro, a verdadeira medida consiste em não cair na pobreza, mas aproximar-se dela o mais possível...

Logo, esta limitação nos será puramente agradável, se tomarmos previamente o gosto pela economia, sem o qual as maiores fortunas são ainda insuficientes e mesmo as mais modestas se prestarão ao desperdício...Habituemo-nos a ter o luxo à distância e a fazer uso da utilidade dos objetos e não da sua sedução exterior (grifo meu). Comamos para matar a fome, bebamos para apagar a sede e reduzamos ao necessário a satisfação de nossos desejos. Aprendamos a andar com nossas pernas, a regular nosso vestuário e nossa alimentação, não sobre a moda do dia, mas sobre o exemplo dos antigos.

Aprendamos a cultivar em nós a sobriedade e a moderar nosso amor ao fausto; a reprimir a vaidade, a dominar nossas cóleras, a considerar a pobreza com um olhar calmo, apesar de todos aqueles que acharão aviltante satisfazer tão modestamente a seus desejo naturais. A não ter nas mãos, por assim dizer, as ambições desenfreadas de uma alma sempre inclinada para o dia seguinte e a esperar a riqueza menos da sorte do que de nós mesmos.

...Tomemos, pois, o hábito de nos abstermos de espectadores quando ceamos...de não termos roupas a não ser para o uso que as criou e de nos alojarmos modestamente. Não é só nas corridas e nos torneios do circo, é também na arena da vida que é preciso saber curvar-se".

Comentário final deste escriba: neste período em que vivemos, em que o consumo responsável e a tal da sustentabilidade se colocam como prementes, não deixa de ser irônico que estas palavras de Sêneca, escritas há milhares de anos, caibam como uma luva nos dias de hoje.

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