terça-feira, 3 de julho de 2007

Schopenhauer e o amor

Voltemos aos nossos posts filosóficos. Agora é a vez de Arthur Schopenhauer. No livro que não canso de mencionar "As Consolações da Filosofia", de Alain de Botton, há um capítulo dedicado a este pensador nascido na Polônia, mas que passou grande parte de sua vida na Alemanha. Schopenhauer tinha uma idéia curiosa sobre o amor. Para ele a paixão acomete os seres humanos com um único propósito inconsciente: perpetuar a espécie. "O momento em que o amor - ou, para ser mais exato, o desejo - entre duas pessoas começa a florescer deve, na realidade, ser encarado como o primeiro passo para a formação de um novo indivíduo", diz ele.

Prossegue Schopenhauer: "Há algo de bastante peculiar na seriedade profunda e inconsciente com que um jovem casal observa um ao outro no primeiro encontro. A troca de olhares sutis e perscrutadores, a cuidadosa inspeção mútua da aparência, o exame rigoroso de todos os traços que compõem cada individualidade nada mais é do que a meditação do espírito, a indagar sobre a viabilidade de ser gerado um novo ser humano"

Portanto, quando estamos atrás do nosso par ideal buscamos na verdade evidências de que teremos uma prole saudável. Não é genial? Mas o melhor está por vir. Segundo Schopenhauer, há um efeito colateral nesta história toda. Somos totalmente ludibriados ao escolher o parceiro a partir das premissas de geração de filhos saudáveis. Achamos que encontramos o par perfeito, mas na verdade nosso interesse é outro. E mais tarde podemos perceber o erro que cometemos. Nas palavras de Alain de Botton:

"...a pessoa que escolhemos como sendo a mais indicada para ter um filho conosco quase nunca é a mais indicada para nós (embora sejamos incapazes de perceber isto no momento que a escolhemos porque a vontade de viver nos ofuscou o raciocínio). " Conseguir que a conveniência e a paixão caminhem de braços dados é o mesmo que receber o mais raro bafejo da sorte", observou Schopenhauer. "

"O parceiro amoroso que livra nosso filho de nascer com um queixo protuberante ou uma índole efeminada não costuma ser a mesma pessoa que nos fará feliz por toda a vida. A busca da felicidade pessoal e da geração de filhos saudáveis são projetos radicalmente opostos que o amor maliciosamente nos confunde e nos leva a pensar que se tratam de um só por um bom número de anos. Não deveríamos nos surpreender com o casamento entre duas pessoas que jamais teriam sido amigas uma da outra. "

Ainda Schopenhauer: " O amor...lança-se sobre as pessoas que fora da relação sexual, seriam detestáveis, desprezíveis e mesmo repugnantes como amantes. A vontade de perpetuação da espécie é tão mais poderosa que a do indivíduo que faz o apaixonado fechar os olhos para todas as qualidades que lhe são repugnantes, tudo tolera, tudo distorce, e acaba por unir-se para sempre ao objeto de sua paixão. Ele se mostra, desta forma, completamente enfeitiçado por uma ilusão, que se desfaz tão logo o desejo de perpetuação da espécie seja satisfeito, mas deixa como herança um cônjuge detestável para o resto da vida..."

Botton finaliza com a seguinte alegoria: Então, um dia, uma mulher com ares de rapaz e um homem com ares de moças irão se aproximar do altar por motivos que nenhum dos dois, ou qualquer outra pessoa, possa ter imaginado...Apenas mais tarde, quando as necessidades da vontade forem satisfeitas e um garoto robusto estiver brincando com sua bola em um quintal de subúrbio, o ardil será descoberto. O casal se separa ou passará a dividir a mesa do jantar em meio a um silêncio hostil" . Como diz Schopenhauer, "a geração futura é providenciada à custa da geração atual".

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