quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A realidade e Jung

Sempre fui um cético. Não um ateu. No máximo, um agnóstico. Porém, ao longo de várias leituras, cursos, estudos e contatos diversos com a espiritualidade fui percebendo que existem certas coisas que não sabemos exatamente como funcionam, mas o fato é que de uma forma ou de outra funcionam. Vou pegar um exemplo para facilitar a compreensão. Pense no cientista Louis Pasteur. Antes dele, como a humanidade compreendia a propagação das doenças? Você podia perguntar para qualquer pessoa mais instruída na Europa no início do século 19 e a resposta viria na palavra miasmas. Tudo se resumia a isso: miasmas. O que eram os miasmas? Como se propagavam? Como se defender deles? Nada. Nenhuma resposta. No máximo, nossos antepassados suspeitavam que algo "no ar" causavam as doenças .

Um dia chegou Pasteur com suas descobertas. E aos poucos luzes foram sendo jogadas em bactérias, vírus e até a vacina foi inventada. O que quero demostrar aqui é que muitas vezes o que não compreendemos é por falta de informação. Em algumas situações temos alguns dados disponíveis, mas, em outros, nada. Porém, na ausência de fatos palpáveis, não podemos descartar abruptamente uma ideia ou a inexistência de um determinado fenômeno. 

Quem melhor descreveu esta angústia do ver para crer foi Carl Gustav Jung psiquiatra suíço e fundador da psicologia analítica. No livro clássico O Homem e os seus sonhos, ele diz logo nas primeiras páginas: "O homem como podemos perceber ao refletirmos um instante, nunca percebe plenamente uma coisa ou a entende por completo. Ele pode ver, ouvir, tocar e provar. Mas a que distância podia ver, quão acuradamente consegue ouvir, o quanto lhe significa aquilo em que toca e o que prova, tudo isso depende do número e da capacidade dos seus sentidos. Os sentidos do homem limitam a percepção que este tem do mundo à sua volta. Utilizando instrumentos científicos pode, em parte, compensar a deficiência dos sentidos. Consegue, por exemplo, alongar o alcance da sua visão através do binóculo ou apurar a audição por meio de amplificadores elétricos. Mas a mais elaborada aparelhagem nada pode fazer além de trazer ao seu âmbito visual  objetos ou muito distantes ou muito pequenos e tornar mais audíveis sons fracos. Não importa que instrumentos ele empregue; em um determinado momento há de chegar a um limite de evidências e de convicções que o conhecimento consciente não consegue transpor".

Para piorar as coisas e mostrar como a análise da realidade é algo quase desumano, Jung acrescentava no mesmo texto: "Além disso, há aspectos inconscientes na nossa percepção da realidade. O primeiro deles é o fato de que, mesmo quando os nossos sentidos reagem a fenômenos reais, a sensações  visuais e auditivas, tudo isso, de certo modo, é transposto da esfera da realidade para a da mente. Dentro da mente esses fenômenos tornam-se acontecimentos psíquicos  cuja natureza externa nos é desconhecida. Assim toda experiência contém um número indefinido de fatores desconhecidos, sem considerar o fato de que toda a realidade concreta sempre tem alguns aspectos que ignoramos desde que não conhecemos a natureza extrema da matéria em si".

Por isso, é importante sermos cuidadosos com nossas convicções e não colocar toda a responsabilidade pela quebra de dogmas nas costas da ciência. Podemos estar usando uma viseira inconsciente que nos impede de ter uma visão mais ampla e de estar mais aberto ao que não compreendemos.