domingo, 23 de outubro de 2011

Por parábolas

Um amigo de velhos tempos leu os dois posts anteriores em que eu especulava sobre a forma de Jesus falar e como suas palavras poderiam ter sido alteradas ao longo do tempo, já que ele não deixou nada escrito e quase todos os evangelhos do Novo Testamento foram escritos no mínimo 50 anos após a sua morte. Talvez isso justifique a forma quase cifrada de suas frases e fazem com que muito papel e saliva sejam gastos para interpretar seus ensinamentos.
     Este meu amigo discorda um pouco desta análise. Ele crê que realmente Jesus falava desta maneira porque não podia revelar tudo de uma vez. Ou seja, as pessoas daquela época não estariam preparadas para compreender a verdade em sua totalidade. Esta consciência se daria pouco a pouco ao longo de centenas de anos. Cada vez que a população subisse mais um degrau no patamar evolutivo, novas interpretações destas palavras seriam apresentadas.
     Para corroborar esta tese ele me apresentou um capítulo do Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, e uma das obras fundamentais desta doutrina. O livro é voltado a explicar algumas palavras de Jesus segundo a mensagem dos espíritos. No capítulo 24, "Não coloque a candeia debaixo do alqueire", lemos que  tudo tem o seu tempo de ser revelado, assim como acontece com o ser humano em seu aprendizado. Uma criança na primeira série não saberá ainda equações desenvolvidas apenas no ensino médio. A mesma coisa ocorre com os ensinamentos de Jesus.
     No livro, surge a seguinte explicação: "É de causar admiração diga Jesus que a luz não deve ser colocada debaixo do alqueire, quando ele próprio constantemente oculta o sentido de suas palavras sob o véu da alegoria, que nem todos podem compreender. Ele se explica, dizendo a seus apóstolos: "Falo-lhes por parábolas, porque não estão em condições de compreender certas coisas. Eles vêem, olham, ouvem, mas não entendem. Fora, pois, inútil tudo dizer-lhes, por enquanto. Digo-o, porém, a vós, porque dado vos foi compreender estes mistérios." Procedia, portanto, com o povo, como se faz com crianças cujas idéias ainda se não desenvolveram. Desse modo, indica o verdadeiro sentido da sentença: "Não se deve pôr a candeia debaixo do alqueire, mas sobre o candeeiro, a fim de que todos os que entrem a possam ver." Tal sentença não significa que se deva revelar inconsideradamente todas as coisas. Todo ensinamento deve ser proporcionado à inteligência daquele a quem se queira instruir, porquanto há pessoas a quem uma luz por demais viva deslumbraria, sem as esclarecer".
     Portanto, não é de surpreender que os próprios apóstolos não tenham compreendido bem os ensinamentos de Jesus. Diante desta lógica, Cristo falava há dois mil anos, mas suas palavras miravam o futuro, quando seriam melhor decodificadas. De qualquer forma, segundo o Evangelho Segundo o Espiritismo, Jesus não teria sido de todo enigmático. Muita coisa era de fácil compreensão para as pessoas da época. Diz o livro, "Pergunta-se: que proveito podia o povo tirar dessa multidão de parábolas, cujo sentido se lhe conservava impenetrável? E de notar-se que Jesus somente se exprimiu por parábolas sobre as partes de certo modo abstratas da sua doutrina. Mas, tendo feito da caridade para com o próximo e da humildade condições básicas da salvação, tudo o que disse a esse respeito é inteiramente claro, explícito e sem ambiguidade alguma. Assim devia ser, porque era a regra de conduta, regra que todos tinham de compreender para poderem observá-la. Era o essencial para a multidão ignorante, à qual ele se limitava a dizer: "Eis o que é preciso se faça para ganhar o reino dos céus." Sobre as outras partes, apenas aos discípulos desenvolvia o seu pensamento...Entretanto, mesmo com os apóstolos, conservou-se impreciso acerca de muitos pontos, cuja completa inteligência ficava reservada a ulteriores tempos. Foram esses pontos que deram ensejo a tão diversas interpretações, até que a Ciência, de um lado, e o Espiritismo, de outro, revelassem as novas leis da Natureza, que lhes tornaram perceptível o verdadeiro sentido..... Se, pois, os Espíritos ainda não dizem tudo ostensivamente, não é porque haja na Doutrina mistérios em que só alguns privilegiados possam penetrar, nem porque eles coloquem a lâmpada debaixo do alqueire; é porque cada coisa tem de vir no momento oportuno. Eles dão a cada ideia tempo para amadurecer e propagar-se, antes que apresentem outra, e aos acontecimentos o de preparar a aceitação dessa outra."
    Em outras palavras, no futuro poderemos ser surpreendidos com novas interpretações e revelações que estavam ocultas nos ensinamentos de Jesus. Bom, não sei quanto vocês, mas estou aqui na torcida para que este tempo chegue logo.

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